quarta-feira, 24 de maio de 2017

Desabafo neste Dia do Orgulho Nerd: a vez que me fizeram crer que eu era burra demais para entender Douglas Adams

Chegada essa data maravilhosinha, em que nós, nerds, podemos celebrar e espalhar nossa cultura (e sair por aí com uma toalha enrolada no pescoço), me vejo lembrando de uma situação vivida por mim, há uns dez anos (marromeno). A púbere Deborah (essa aqui que vos fala), aos 15 aninhos de idade, foi taxada como burra demais para ler e entender o humor de Douglas Adams e a trilogia (de cinco livros, risos) do Guia do Mochileiro das Galáxias.
Se não me falha a memória, o ano era 2004. Eu cursava o primeiro ano do ensino médio e tinha um namorado novo, do qual eu gostava MUITO. O rapaz era cinco anos mais velho que eu (sim, ele tinha 20 anos de idade. E, sim, deve ter alguma coisa muito ilegal nisso) e eu convidei o mancebo para a festa junina do meu colégio.
Como morávamos longe um do outro dificilmente conseguíamos nos ver sem que um ou outro enfrentasse 2h de ônibus e metrô. Normalmente era eu quem fazia o trajeto, todos os domingos, de manhã cedinho, e voltava tarde da noite para casa e escutava minha mãe brigar horrores (hoje vejo que era com toda a razão). Também era comum que eu ligasse todos os dias para ele, sem falta, e passássemos horas seguidas ao telefone, conversando ou, o mais comum, em silêncio. Não era uma relação fácil. Era meu segundo namoro, eu era muito nova e sem qualquer experiência. Ele era mais velho e vez ou outra se aproveitava e fazia origami com meu papel de trouxa.
Hoje eu sei que vivia em um relacionamento abusivo. Ele, mais velho e experiente, cheio de si e dos mil contatinhos. Pronto para jogar na minha cara que ele era bom demais, que eu tinha sorte em estar com ele.... Que meus amigos eram muito fracos, muito feios, muito burros e ignorantes. Que eu ainda era muito menina, mas que ele me mostraria coisas boas, de qualidade, que sozinha eu JAMAIS conseguiria descobrir. Eu deveria agradecer por ter a chance de ser a namorada dele.
Enfim.... Essa festa junina: foi bem chata. Ele e mais duas colegas de colégio, junto a mim, decidimos que seria melhor ir para o shopping e ver algum filme no cinema. Foi feito. Maior parte do tempo a gente se divertiu, mas vez ou outra ele soltava piadinhas sobre como eu e uma das colegas não conseguiríamos entender um filme X que estava em cartaz. O clima ainda estava agradável. Ainda...
Chegando no shopping, ficou decidido que veríamos a adaptação do Guia do Mochileiro das Galáxias (que eu não conhecia bem, até então), mas logo na fila as piadas dele começaram a irritar minhas colegas. Afinal de contas, quem é que gosta de ser chamado de burro? Quem concordaria com uma pessoa que se julga superior a você, sem conhecer todas as suas capacidades e, por se julgar superior, se acha no direito de te rebaixar?
Bem... Eu concordei.
Meu medo era tanto de brigar com ele e provocar MAIS UMA discussão que eu só me calava. Eu abaixava a cabeça e aceitava, pois não podia perde-lo. Afinal de contas, ele era muito bom. Eu não. Ele era muito inteligente. Eu não. ELE me julgou incapaz de entender Douglas Adams. Eu acreditei.
Foram alguns meses de uma relação doentia, onde me tornei totalmente dependente dele e das neuras dele. Quando a relação acabou, me vi doente, sem vontade de comer, sair de casa ou viver. A única coisa que me manteve lúcida, foi estudar. Curiosamente, no bimestre em que nos separamos, foi o bimestre em que minhas notas foram as mais altas.
Anos depois, e com mais experiência, percebo a quão burra eu fui em acatar com essa e demais ideias que ele tinha sobre mim. Poxa, ele nem me conhecia e resolveu ensinar a mim o quão superior ele era e como eu, aos 15 anos de idade, deveria viver e me comportar para ser digna dele. Ele, um cara maior de idade que só se envolvia com garotinhas, provavelmente porque elas eram mais fáceis de manipular.
Enfim...
Fiquei um bom tempo sem realmente ler O Guia pois, de fato, me sentia rebaixada e incapaz de compreendê-lo. Quando, finalmente, me dispus a ir atrás e ler todos os livros, percebi que eu realmente fui burra, mas não do jeito que ele dizia que eu era.
Fui burra por acreditar nele. Fui burra por não ter ouvido o que minhas colegas disseram naquele dia, em frente ao cinema.
Fui burra pois fiz o que fiz ao ter entrado em pânico, pensando estar sozinha sem ele.

Tadinha de mim. Se eu tivesse ignorado esse mancebo e tivesse lido O Guia do Mochileiro das Galáxias saberia, logo na capa, que eu não deveria ter entrado em pânico.


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