quarta-feira, 28 de março de 2012

Cacos, chicletes e mosaicos.



"Tristeza é que nem chiclete. Você tem que mastigar e mastigar, até que vire uma massa sem gosto e sem graça... Aí você cospe."*

Certa vez escutei essa frase, e ela ecoou em minha mente até então. E no dia de hoje, eu queria ter me lembrado dela, em uma súbita intervenção telefônica, regada a ressentimentos, dúvidas e lágrimas.

Por isso, vou escrever agora. Por isso, vou falar o que, naquela hora, não tive como dizer.
Você me disse que estava quebrada. Que não tinha mais o que fizessem com você, não sobrou um pedacinho inteiro. Você me disse estar em cacos.
E é aí que eu lhe digo, após remoer meus pensamentos entre as divagações eternas e absurdas dos meus colegas.
São dos cacos que nascem as melhores obras de arte. Os mais belos mosaicos, as mais lindas esculturas são moldadas em "cacos" de pedras, os fantásticos vitrais das catedrais góticas... O que é a música, se não a junção de seus "cacos", as notas musicais? E as pinturas, fragmentadas em cores e formas, partículas e mais partículas de pigmentos e porções de tinta.
As mais saborosas comidas são constituídas em partes; em "cacos" de sabores que, se consumidos separadamente, podem nos entorpecer tamanho o enjoo que nos causam.
Na natureza, a estrela-do-mar é o exemplo de regeneração. Por mais partes que você a divida, sempre surgem reconstituições, reproduções, vindas de seus "cacos".

Você está em cacos, sim. Mas o mundo não vai parar para que você possa colá-los.

Camilla, ninguém é inteiriço. Todos nós, seres humanos, somos feitos da junção de milhões de "cacos", que são quebrados e recolocados ao decorrer de nossas vidas.
Eu sei que você, inteligente e forte como é, vai conseguir juntar todos os caquinhos e montar um lindo mosaico e, assim, esfregá-lo na cara do mundo.

Mas enquanto você cria esse desenho juntando seus cacos, mastigue esse seu chiclete. Uma hora o sabor acaba, o amargo passa e, quando seu maxilar doer depois de tanto mastigar... Cuspa!

Mas cuspa na cara deles, ok?! ;)




* Escutei essa frase no terceiro episódio da série da TV Cultura, "Tudo o que é sólido pode derreter". Quem quiser pode assistir os episódios gratuitamente aqui.